A QUESTÃO DOS ADOLESCENTES QUE COMPLETAM 15 ANOS NO PROGRAMA DA BOLSA ESCOLA
RELATÓRIO DA OFICINA REGIONAL – CABO DE SANTO AGOSTINHO – 21 E 22/10/1998
PROJETO: FORMAÇÃO DOS SUJEITOS SOCIAIS ENVOLVIDOS COM O PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL – PETI
ABERTURA
A abertura foi feita por Moura misturando todos os participantes para se conhecerem, e colocarem suas expectativas para a oficina. Houve participantes dos municípios de Água Preta, Catende, São Benedito do Sul, Bom Jardim, Ribeirão, Cabo de Santo Agostinho, Aliança, STAS, SAS de Pernambuco, PROMATA, CIELA, Escola Agrotécnica de Barreiros, Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Cabo, Terra dos Homens.
Esta é a oitava Oficina Regional que o SERTA está realizando desde que iniciou este projeto com o apoio do UNICEF, continuado pela SAS. Moura fez uma retrospectiva histórica das Oficinas Regionais e situou as locais. A temática de todas elas têm sido os pontos que chamamos de INTERFACES, temáticas que se relacionam com o bom êxito do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Entre estas, já foram estudadas:
Nº | Temática | Data |
---|---|---|
1 | A geração de renda e o PETI | novembro de 1997 |
2 | O trabalho com as famílias (coordenada pelo CENAP) | novembro de 1997 |
3 | A cana de açúcar e o desenvolvimento sustentável e a relação com o PETI | fevereiro de 1998 |
4 | As implicações da merenda escolar no Programa Bolsa Escola | abril de 1998 |
5 | A questão rural e o PETI | maio de 1998 |
6 | A sistematização da Proposta de Educação Rural | junho de 1998 |
7 | A construção do projeto político-pedagógico de uma escola na área rural | agosto de 1998 |
8 | O que fazer com os pós 15 anos? | outubro de 1998 |
Todas estas temáticas e outras mais têm sido desdobradas em Oficinas Locais. Os presentes receberam um dossiê completo com os relatórios das Oficinas realizadas através deste projeto até o mês de setembro de 98. No final do ano, o SERTA passará aos seus parceiros um dossiê completo com os relatórios, as produções teóricas e os textos didáticos.
A expectativa dos participantes dos municípios novos era o contato com os novos, com a abordagem do tema, que para os mesmos, ainda não se constituíra problema, mas breve iria começar. A temática causa muita curiosidade. Os mais antigos, por mais experiência que tinham, ainda acham muitas dificuldades. “É uma batalha constante de enfrentamento de dificuldades”. Havia um interesse especial, por que até agora, só trabalharam com os que tinham até 15 anos e o pós 15 anos cresce a cada dia mais, aumenta gradativamente.
I. PRIMEIRA PARTE: COMO SE APRESENTA A QUESTÃO NOS MUNICÍPIOS
Como é costume na metodologia das oficinas do SERTA, o ponto de partida foi o levantamento do problema a nível municipal, a partir da experiência, do contato e vivência que as próprias pessoas presentes tinham com a questão. Cada município situou a questão.
Pelas apresentações, o que se observou é que há municípios que mantém serviço permanente de reunião com as famílias, que consta de visitas e reuniões, com uma equipe específica para esta tarefa. Este grupo articula as necessidades das famílias com os serviços públicos da prefeitura. Os alunos (as) pós 15 anos continuam estudando, e tendo acesso à alimentação, só perdendo a bolsa. É o caso de Catende.
Há outros, que também, mantém avaliação permanente com as famílias. Inclusive com iniciativas novas. O trabalho com as famílias, agora está sendo articulado com a questão da saúde. Há exigências que se fazem às famílias para receber a bolsa (o cartão de vacina dos filhos, o atestado de exame preventivo de câncer). É o caso de São Benedito do Sul.
Há também municípios, sem nenhum serviço específico com as famílias. As reuniões acontecem com as famílias quando tem bronca para resolver. A Questão do pós 15 anos ainda não tem sido colocada. Os novos ainda estão para se defrontar com o problema.
Diversos comentários surgiram sobre o aumento da crise da cana na zona da mata. Tirar o adolescente e a criança da palha da cana, foi um motivo forte para o surgimento do Programa. Oferecer alternativas diferentes era sonho de muitos envolvidos. Agora, nem a palha da cana está oferecendo serviço e outras alternativas ainda estão distantes. O que agrava mais ainda a situação da juventude no meio rural.
Com as contribuições da STAS, que trouxe todos os dados sobre os alunos (as) que já perderam a bolsa, se construiu o seguinte quadro dos pós 15 anos.
Quadro comparativo – Anos de 1997 e 1998
Mês | Ano de 1997 | Ano de 1998 |
---|---|---|
JANEIRO | 00 | 173 |
FEVEREIRO | 01 | 211 |
MARÇO | 02 | 210 |
ABRIL | 00 | 229 |
MAIO | 02 | 218 |
JUNHO | 02 | 208 |
JULHO | 08 | 243 |
AGOSTO | 79 | 238 |
SETEMBRO | 121 | 279 |
OUTUBRO | 141 | 284 |
NOVEMBRO | 147 | 296 |
DEZEMBRO | 151 | 270 |
Total Geral | 3.513 |
Quadro por municípios no ano de 1998
MUNICÍPIOS | COMPLETARAM 15 ANOS | METAS | % |
---|---|---|---|
ÁGUA PRETA | 369 | 3412 | 10.22 |
AMARAGI | 183 | 1801 | 10.04 |
BARREIROS | 355 | 3082 | 11.51 |
CABO | 494 | 4308 | 11.71 |
CATENDE | 272 | 2538 | 10.67 |
JAQUEIRA | 102 | 1006 | 10.13 |
JOAQUIM NABUCO | 148 | 1311 | 11.28 |
MARRAIAL | 111 | 1024 | 10.83 |
PALMARES | 300 | 3046 | 9.84 |
PRIMAVERA | 130 | 1210 | 10.74 |
SÃO BENEDITO | 161 | 718 | 22.42 |
TAMANDARÉ | 148 | 1210 | 12.23 |
XEXEU | 86 | – | – |
1.2 ANÁLISE E SÍNTESE DOS DEBATES
Concluída a primeira rodada de informações dos municípios e os debates, os educadores do SERTA fizeram a primeira análise da questão.
1. Os alunos estão concluindo seu tempo no Programa Bolsa Escola e mesmo assim, continuam freqüentando as aulas e tendo acesso à alimentação. Tal informação é alvissareira, revela um salto de qualidade. Temia-se que ao completar a idade, os alunos ficassem só com a jornada regular. É sinal de que o aluno ou aluna e seus familiares estão entendendo que a filosofia principal do Programa não é bolsa.
2. Uma informação tão feliz como esta não pode ser generalizada, pois o grupo presente é pequeno, e não investigou a questão como preocupação. Isto é, não houve rigor na pesquisa para saber como está acontecendo em geral nos municípios.
3. O fato de verificar, começar a perguntar em cada visita ou contato, já estimula as pessoas a se preocuparem com a questão. É um exercício que se pode fazer na própria sala de aula, em reuniões com as famílias.
4. Porque os jovens continuam ou não na escola depois de completarem 15 anos dentro do Programa Bolsa Escola? Conhecer estes motivos é importante para todos os envolvidos. Permanecem porque tem uma boa refeição? Porque o ensino e a aprendizagem são interessantes? Porque gostam do ambiente e do clima da escola? Porque se sentem acolhidos e valorizados?
5. Colocar a questão dos pós 15 anos, traz associadas outras idéias e preocupações. Profissionalização, trabalho, renda, situação econômica das famílias, alternativas de produção e renda no município.
6. Se esta oficina pudesse contribuir para um primeiro passo nesta direção, teria cumprido o seu papel e atingido o seu objetivo.
7. Seria muito oportuno começar a fazer reunião em nível de município com os que já concluíram seu tempo no Programa. Pois este tema está sendo estudado pelo governo federal, como possível objeto de um Programa complementar ao da Bolsa Escola.
II. SEGUNDA PARTE: APROFUNDAMENTO A PARTIR DAS TENDÊNCIAS
Na parte da tarde, houve trabalhos de grupos para analisar as possíveis tendências nos próximos 10 anos. Como estarão os jovens daqui a 10 anos, a julgar pelo que vem se sucedendo com eles. Houve quatro grupos de trabalho. Pelas contribuições dos grupos, há percepções bem diferentes sobre as tendências.
1. Muita positiva: Grupo que acredita que este Programa da Bolsa Escola vai ter tanta força na educação dos jovens que atualmente estudam, que daqui a mais dez anos, os jovens estarão bem mais escolarizados, profissionalizados como mecânicos, pedreiros, artesãos, agricultores etc. Estarão trabalhando na economia informal, como autônomos. Permanecerão mais no campo, onde haverá escolas de segundo grau, e os jovens serão cidadãos mais críticos, eleitores conscientes.
2. Muito negativa: Houve grupo em linha contrária a primeira. Acha que o Programa não vai ter esta força toda, por conta da realidade econômica, social e política que estamos vivendo, ser muito crítica e sem perspectiva. A crise na zona da mata está se agravando dia a dia e só intervenções fortes, decisões políticas a nível federal, estadual e municipal, poderiam mudar a tendência.
3. Média: Houve também intervenções que ora se aproximaram mais de uma, ora de outra. Para a situação dos jovens daqui a 10 anos, estar melhor, precisaria muito investimento, muita mudança, pois a realidade é muito dura atualmente. Trabalho na área rural, só com Reforma Agrária ou pelo menos, redistribuição de terras.
1.3 ANÁLISE E SÍNTESE DAS CONTRIBUIÇÕES DOS GRUPOS
O debate da plenária girou mais em torno da possibilidade ou não da escola e do Programa, influenciar a tendência futura. Alguns acreditam piamente que vai haver mudanças significativas, por conta da escola estar com a Bolsa. É o pensamento que atribui a educação um papel muito mais importante, do que ela pode desempenhar.
Sabemos que na zona da mata, a educação isolada não vai mudar a realidade. Existem inúmeras pessoas formadas com cursos universitários, profissionalizantes, que estão desempregados. Existem profissionais competentes, pedreiros, carpinteiros, mecânicos que estão desempregados. Há outras questões que interferem na realidade, apagando o efeito positivo que a educação poderia ter.
A educação poderá seguir o caminho da auto-suficiência, como tem acontecido até agora. Caminhar dentro do sistema escolar, como se este dessa conta do processo educativo e da formação da cidadania. Mas também a educação poderá seguir outro caminho, da interdependência, da inter-relação, das interfaces, da ligação com o trabalho, com a economia, com o desenvolvimento da comunidade, com o meio ambiente e com o próprio município.
Para isto é fundamental que a escola ou a educação, reforçadas com o Programa da Bolsa Escola, possam ajudar a abrir o sistema escolar, ampliar as formas de educação. Que não seja uma jornada regular de educação, que deva ser ampliada por mais quatro horas, mas que seja um refazer da concepção da escola, da educação, uma nova e diferente forma de fazer educação.
Entendemos que a preocupação com os pós 15 anos, poderá ajudar os municípios a repensarem a educação, os projetos pedagógicos, os indicadores de avaliação, os currículos etc. E a partir daí, descobrir a realidade do município que precisa ser estudada, pesquisada.
1.4 MESA REDONDA COM AS INFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS
A proposta da mesa redonda, era para trocar informações institucionais que se relacionam com a questão. Muitas instituições não puderam comparecer. Contou com sete instituições, incluindo o SERTA.
STAS: A representante, Carmem, resgatou a história da implantação do Programa Bolsa Escola, com a participação das 3 esferas do governo e muitas outras instâncias que acompanharam: Ongs, fóruns, Comissão Estadual, Pacto, Comissões Municipais. Mesmo havendo uma matriz, os municípios têm autonomia para construir o seu modelo. Ninguém o tem de forma acabada. De modo que os municípios podem construir seus modelos próprios e daí podem pensar o pós 15 anos, articulados com as necessidades do município.
SAS – RECIFE: Conceição Magalhães informou que desde a visita do Ministro da Previdência a Mata Sul, que o mesmo se sensibilizou pelo problema dos jovens e recomendou a Cristina Albuquerque, coordenadora nacional do Programa, para pensar algo nesta direção, para os que completam a idade e perdem a bolsa.
PROMATA – SEC. PLANEJAMENTO: Geraldo Magela apresentou um resumo do PROMATA que consta de 4 subprogramas: 1. Melhoria dos serviços básicos; 2. Diversificação econômica; 3. Apoio ao Desenvolvimento Regional; 4. Fortalecimento Institucional.
ESCOLA AGRÍCOLA DE BARREIROS: O professor Valmir mostrou como a partir de maio, conheceu o SERTA numa discussão sobre a Questão Rural e o PETI. A escola passa por uma reforma para atender melhor aos municípios. A escola está se prontificando para ajudar os municípios.
CIELA: Inalda apresentou a natureza das atividades do CIELA, que tem sido, sobretudo a pesquisa. Em seguida, resumiu a proposta do projeto em parceria com a Escola de Barreiros, para a profissionalização de 120 jovens e adolescentes, durante um ano com duas turmas.
TERRA DOS HOMENS: É uma entidade da Holanda, de cooperação internacional. Recolhe recursos da sociedade civil, do governo holandês e da comunidade europeia. Mantém no Nordeste 12 projetos com crianças e adolescentes, com maioria na educação formal e creches.
III. TERCEIRA PARTE: ENCAMINHAMENTOS
Os grupos apresentaram sugestões para encaminhar a discussão da temática nos municípios, escolas, comunidades e instituições:
Encaminhamento |
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Discutir nas escolas juntamente com coordenadores e monitores a situação sócio econômica dos jovens a partir dos 15 anos. |
Motivar prefeitos e secretários para conhecer as iniciativas em São Benedito do Sul, não para copiar, mas se inspirar. |
Batalhar por cursos profissionalizantes que venham atender as necessidades dos municípios e não de instituições isoladas. |
Batalhar por Política municipal com diagnóstico das necessidades do município. |
Estimular a prefeitura municipal, a comprar os produtos dos agricultores para a merenda. |
Que a STAS e a SAS sejam mais exigentes com os prefeitos, usando da autoridade que estão revestidas para monitorar o Programa. |
Pesquisar o quantitativo de crianças e grau de escolaridade / diagnóstico escolar, em cada comunidade, escola. |
Sondar as expectativas e os interesses (se trabalha… o que gostaria de fazer, onde?) |
Desenvolver mais parcerias entre secretarias: educação, saúde, ação social. |
Que este levantamento de dados em longo prazo venha ser feito e discutido na escola. |
Articular discussões sobre a temática com os Conselhos Municipais, Comissões, ONGs, STRs. |
Aprofundar a sistematização dos dados apresentada pelos órgãos SAS/PE e STAS. |
Desenvolver capacitação com as Comissões Municipais sobre a temática. |
O município credenciar entidades em condições de serem capacitadores. |
Aprofundar nas escolas, nos municípios, os impactos que o Programa Bolsa Escola está provocando. |
Contribuir para que o município construa um Plano de Desenvolvimento. |
Rever os Currículos das escolas rurais. |
Envolver no planejamento da escola o cotidiano da vida dos alunos (as) e familiares. |
Cabo de Santo Agostinho, 22 de outubro de 1998.