3.1.5. Texto coletivo MOC-SERTA sobre a Peads – 2001

TECNOLOGIA ALTERNATIVA – SERTA
MOVIMENTO DE ORGANIZAÇÃO COMUNITÁRIA – MOC
PROPOSTA EDUCACIONAL DAS DUAS INSTITUIÇÕES
TEXTO SOBRE EDUCAÇÃO RURAL

 

Texto escrito em setembro de 2001, antes da publicação das Diretrizes Operacionais para
a Educação Básica nas Escolas do Campo, solicitado pela Contag, para apresentar no
encontro que reuniu onze instituições e experiências para preparar subsídios para o
Conselho Nacional de Educação elaborar as Diretrizes. Importante pelo valor histórico.
Foi uma síntese da Peads na época que foi escrito.

          Esse texto é uma produção coletiva do Serviço de Tecnologia Alternativa – SERTA de Pernambuco e Movimento de Organização Comunitária – MOC da Bahia. Ele expressa o pensamento das duas instituições sobre a Educação Rural: o que pensam, o que fazem, que resultados estão alcançando.  Ambas utilizam as mesmas concepções, princípios e metodologia, tanto no campo formal como não formal da educação rural. Utilizam didáticas, dinâmicas, material pedagógico adaptado aos contextos culturais onde atuam. O objetivo do texto é pontuar de uma forma sintética o que ambas têm em comum para partilhar com outras pessoas e grupos que pensam, fazem e lutam por uma educação rural.

  1. O QUE LEVAR EM CONTA QUANDO SE FALA EM EDUCAÇÃO RURAL.
    1.1. A situação da educação rural.

Já existe um consenso generalizado sobre as precariedades da educação e da escola rural: os elementos humanos disponíveis, os processos de formação, supervisão e monitoramento, alto nível de evasão escolar e repetência, defasagem idade-série, turmas multiseriadas, infra-estrutura e espaço físico insuficientes, salários desestimulantes. Além dessas condições, impera o preconceito de que a escola rural é para o pobrezinho, o matuto, a criança conformada com a pouca aprendizagem, incapaz de ser avaliada com rigor. O currículo oculto passa a idéia de que o mundo rural precisa ser deixado por quem quer vencer na vida, uma vez que nesse não há chance de progredir. Argumentam que os pais são pobres porque são agricultores e não por outras razões.  O papel que a escola exerce é de destruidora da auto-estima do agricultor. Favorece ao êxodo.

 

1.2 Referenciais de tentativas de intervenção para melhorar a escola rural.

Boa parte das intervenções para modificar a realidade da escola rural, parte do princípio que os problemas da mesma, estão nessas carências. A solução, então, é atender às mesmas. As soluções param nesses âmbitos: adaptações de currículos à realidade rural, aumento de material didático, jornada complementar, melhora da infra-estrutura, reforço da merenda escolar, aquisições de equipamentos, auxílio econômico às famílias, formação de professores e etc. Os programas governamentais tipo PETI, Bolsa Escola e similares não avançam além dessas soluções. Muitos municípios quando reivindicam uma melhor educação rural, cobram essas iniciativas. Gestores, beneficiários e participantes de programas desse porte satisfazem-se com o alcance desses resultados. São condições que vem melhorar a escola a fazer melhor, o papel que sempre fez: ensinar a ler, escrever e contar.

1.3 Nossos referenciais para pensar a educação rural

Pensamos também, que essas carências fazem parte do problema. Porém, estão longe de ser a parte mais importante. Há questões que estão no alicerce dessas carências. Precisam ser atingidas onde estão, na base, nas raízes, nas causas. A intervenção quando atua apenas nas carências, resulta camuflando, escondendo as questões mais profundas. Cria um campo de intervenção tão amplo, mobiliza tantas energias e recursos, gratifica tantas pessoas, traz tantos dividendos políticos, que impermeabiliza as pessoas de mergulharem mais fundo na análise da educação e escola rural. Não se discute o papel que a educação vem exercendo no meio rural. Não se discute qual a cultura e o modelo de desenvolvimento que criaram essa educação e essa escola e são alimentados por elas. Não se questiona sobre os fins, os porquês, os qualitativos. Apenas sobre os meios, o como, o onde, os quantitativos.

  1. A NOSSA CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO.
    2.1. Educação e cultura

    Tanto a escola como a educação rural existem dentro de uma cultura. É dentro da cultura existente, que a escola e a educação são construídas. A educação favorece e reforça a cultura. Segundo Durkheim, a educação é o que os mais velhos ensinam aos mais moços para esses comportarem-se como aqueles. Esse tem sido o grande papel tradicional da educação. A recíproca é verdadeira, a cultura favorece e reforça os modelos de educação e de escola. A cultura é o que está mais profundo nas pessoas e grupos, representa o inconsciente coletivo, é ela que determina os hábitos e costumes. No entanto, a cultura tradicional e vigente exige da escola apenas um papel pedagógico, didático de ensinar a ler, escrever, calcular, como aprendendo essas coisas, as pessoas estivessem aptas para viver bem no mundo atual. Os esforços convencionais por uma educação de qualidade reforçam esse papel.
    2.2. Educação e modelos de desenvolvimento.
    Desenvolvimento com sustentabilidade é hoje um grande consenso.  O MOC e o SERTA estão trabalhando educação, para que a escola ajude, reforce, contribua para a criação desse novo modelo.  E também pela recíproca, para que esse novo modelo inspire a educação e a escola. Acreditamos também, que se não for assim, a educação estará trabalhando para outros modelos de desenvolvimento e por eles está sendo reciprocamente reforçada. A educação, nem a escola são neutras diante dos modelos de desenvolvimento. Elas são fruto e semente ao mesmo tempo dos modelos vigentes nas culturas. Em outras palavras, elas são políticas, elas exercem um papel político, elas ajudam a construir ou a modificar os modelos que as inspiram. A educação e a escola do meio rural reforçam o modelo insustentável de desenvolvimento. Não dá para pensar sustentabilidade com essa educação.

2.2Educação e educação do Campo.
Só podemos distinguir educação rural de educação urbana, levando em conta essas premissas. Se o papel da escola na área rural for só o de ensinar a ler, escrever e contar, o que se tem a acrescentar na escola rural, é apenas no nível das adaptações didáticas, no nível de atendimento das carências, para que a mesma possa viabilizar melhor o seu papel. Com mais recurso, a escola rural cumpriria melhor a sua função. Mas, se for para a escola exercer outro papel, se for para ajudar a construir outro modelo e por ele se inspirar, algumas tarefas específicas justificam a distinção entre educação rural e urbana. Entre elas, o resgate e o fortalecimento da auto-estima do agricultor familiar. Descobrir o que existe também de prazeroso em ser agricultor, pois o que até agora, a escola fez, foi insistir no vergonhoso e pesaroso. Não se trata apenas de adaptações curriculares, de didática, mas de postura, de filosofia, de visão de mundo, de tarefa política específica no meio rural.

  1. Concepção teórico-metodológica.

          As duas entidades pontuam, cada vez mais que fortalecem a sua prática, que a riqueza da mesma está na concepção filosófica, teórico-metodológica. As ações didáticas, as dinâmicas, os conteúdos são resultados dessa concepção. Não dá para separar essas dimensões da concepção. Em outras palavras, a Proposta Educacional prevê um novo e inovador papel para a educação. Poder-se-ia até dizer que, historicamente, esse papel não é novo, a escola já exerce nas culturas onde estão situadas. Novo, seria o contexto. Isto é: Se antes, ela reforçou sempre o modelo de desenvolvimento vigente e por ele foi reforçada, é chegada a hora de fazer o mesmo com o desenvolvimento sustentável, reforçá-lo e por ele ser reforçada. Não haveria nada de novo. Seria apenas fazer o que sempre fez em outros contextos de desenvolvimento.
         Esse raciocínio é correto, mas tem um detalhe. É que os modelos tradicionais de desenvolvimento já estão incorporados à cultura, já fazem parte dela. De modo que, a escola já atua reforçando-os ou sendo reforçada, quase que de forma inconsciente. É como se a educação já exercesse culturalmente esse papel. Como um católico, que é católico simplesmente por conta de a família ter sido e não por opção de fé. Esse papel, a educação já exerce de forma tão arraigada e incorporada, que os estudiosos da sociologia do currículo, chamam de currículo oculto.  Na nossa visão, essa tarefa teria de ser explícita. O novo modelo de sustentabilidade está longe da nossa cultura, da nossa economia, da nossa política, da nossa gestão. Os modelos tradicionais ao contrário, já estão incorporados, aculturados. Para criar nova cultura e novo modelo, só com novos papéis inovadores.

 

3.1 .Princípios da Educação que baseiam a opção do MOC e do SERTA

  1. A escola tem um papel junto aos modelos de desenvolvimento e a cultura, que precisa ser explícito. Sem explicitar esse papel, as iniciativas para melhorar a educação rural arriscam-se a permanecer na superfície, nos meios e não nos fins, no que de fato, pode fazer mudanças.
  2. O conhecimento não é neutro e é instrumento privilegiado de intervenção na realidade para modificá-la. Há um modelo novo, que ainda não está incorporado a cultura e precisa ser construído. O conhecimento é uma ferramenta que deve ser usada a favor da incorporação desse modelo na cultura
  3. Conhecimento, todas as pessoas possuem e podem construir melhor ainda. Sendo assim, a escola precisa levar em conta os conhecimentos que os pais, os alunos já dominam e todos são aprendizes e mestres, cada um em seu lugar social. Ninguém é dono do conhecimento. Essa convicção muda a postura dos envolvidos no processo.
  4. A construção do conhecimento passa por outros paradigmas diferentes dos que estamos acostumados: compartimentado, separado. Sem uma visão holística e interdisciplinar não é possível entender a sustentabilidade do desenvolvimento e a ligação da educação com as interfaces do mesmo.
  5. Os espaços pedagógicos de formação não são apenas os espaços de sala de aula, mas também aqueles da produção agropecuária, da família , da convivência social, da cultura, dos serviços. A sala de aula é um espaço específico de sistematização, de análise e de síntese (LDB).
  6. A pesquisa não é só uma ferramenta de construção de conhecimento, mas é uma postura diante da realidade. Educando e educador precisam assumir essa postura com senso crítico, curiosidade e “questionamento reconstrutivo” (Pedro Demo) e ao mesmo tempo, cultivar essa ferramenta como metodologia de ensino e aprendizagem
  7. Educação não se faz sem Cidadania, sem participação política, sem envolvimento dos sujeitos sociais no projeto de vida das comunidades. O Desenvolvimento com sustentabilidade, exige construção e controle social de Políticas Públicas Sociais Básicas e para o Desenvolvimento. Tudo isso começa na escola.
  8. A avaliação do ensino e aprendizagem engloba não só os conhecimentos, enquanto conteúdos, nem só os instrumentos, como também os processos, os produtos, numa dimensão permanente e sistemática, em formas de hétero e auto-avaliação.
  9. Os conhecimentos novos construídos de forma inovadora provocam os participantes do mesmo a novas ações e posturas. A aprendizagem dirige-se ao aprender a aprender, a ser, a fazer, a conviver como diz a UNESCO. Nós acrescentamos aprender a compartilhar.
  10. Os paradigmas da sustentabilidade supõem novas relações entre pessoa e natureza, entre os seres humanos e os demais seres dos ecossistemas. A educação para o desenvolvimento leva em conta a sustentabilidade ambiental, agrícola, agrária, econômica, social, política, cultural e intergeracional.
  • Metodologia

    A metodologia trata de efetivar e viabilizar esses princípios. É construída em função desses princípios, ou seja, em função dos fins da educação. Precisa viabilizar as crenças, os valores, presentes nos princípios. Na Proposta Educacional das duas entidades só há uma metodologia. Para desenvolvê-la, existem mil técnicas, dinâmicas, variações, adaptadas às circunstâncias locais, ao campo formal ou não formal. O MOC desenvolve a Proposta na região sisaleira da Bahia da primeira a quarta série, o SERTA na zona da mata, do agreste e de transição das duas, em Pernambuco, no meio rural e urbano, da primeira a oitava série. No Estado de Rondônia, a mesma Proposta é aplicada no garimpo de cassiterita, município de Ariquemes. Ambas as entidades utilizam a Proposta em parceria com os municípios, no campo formal da jornada regular, como no não formal, da jornada ampliada. No entanto, essas adaptações são feitas dentro de um roteiro metodológico básico que incluem 4 etapas. Essas etapas não são cronológicas, isto é, não vem uma depois das outras. São ontológicas e dialéticas. Há uma predominância circunstancial de uma sobre outra, no momento que se desenvolve cada uma.


    Primeira etapa


    Nós utilizamos vários verbos para indicar essa etapa. Cada verbo explicita uma dimensão. Conhecer, ver, levantar dados ou informações, observar, pesquisar através de perguntas, de observação, de ‘tempestade de idéias’. Significam a primeira aproximação que os educandos fazem com o tema ou a realidade a ser estudada. A construção do conhecimento é feita a partir do que as pessoas já vivenciam, experimentam, sentem ou sabem. Essa primeira aproximação é imprecisa, particular, sensível. Corresponde a um levantamento inicial de saberes, de práticas, dados e informações. A educadora/or passa como tarefa, como dever de casa, como trabalho escolar, na medida do possível envolvendo outras pessoas que não só os educandos na geração desses dados. Daí, uma importância fundamental dessa tarefa no envolvimento da família e da comunidade. (Ver em anexo fichas pedagógicas ou o livro

    Escola Rural, uma experiência, uma proposta, MOC. Feira de Santana-BA, segunda edição).

  • Segunda etapa

Com os resultados apresentados pelos educandos em sala de aula, a educadora passa a processar os dados, as informações e os conhecimentos trazidos pelas pesquisas e tarefas dos educandos. Usamos os verbos analisar, desenvolver, desdobrar, julgar, aprofundar, computar os dados para análise. Nessa etapa, o conhecimento avança para outro patamar, a educadora junta, tematiza, acrescenta, enriquece, desdobra em conteúdos curriculares de matemática, português, ciências, história, cultura, arte. Dependendo do assunto pesquisado pelo aluno, a professora amplia mais ou menos os conteúdos, porém, sempre de uma maneira interdisciplinar. Nesse processo de análise e aprofundamento, a educadora faz uso de novas pesquisas. É a primeira etapa sendo usada dentro da segunda. A educadora também avalia como foi a pesquisa, as dificuldades que os alunos encontraram, como se sentiram, como foram acolhidos. É a quarta etapa dentro da segunda. A predominância, porém, é de aprofundamento.

  • Terceira etapa

Uma vez os conhecimentos tendo sido desdobrados, aprofundados e analisados, eles serão sintetizados, arrumados para serem apresentados pelos educandos para as famílias ou outros grupos que participaram da construção inicial desse conhecimento. Os educandos e a educadora vão dar uma satisfação, fazer uma prestação de contas, do que foram capazes de fazer com as informações iniciais que colheram. E vão provocar as pessoas com o novo conhecimento adquirido para uma ação. Usamos os verbos transformar, agir, intervir na realidade. Se partimos do princípio de que, o conhecimento não deve ser uma mera construção intelectual, e que a escola tem um papel político e pedagógico para com os educandos e a comunidade, é a hora de provocar essa mudança. Os educandos procuram enriquecer essa devolução com recursos artísticos e culturais, como poesia, teatro, gráficos, desenhos, apresentações animadas. É uma forma de reconstruir os conhecimentos, apropriar-se e também uma forma prazerosa de apresentar aos pais.

  • Quarta etapa

No decorrer de um mês ou mais, a escola já passou por um processo dessas três etapas. Já pesquisou, já aprofundou os dados, já devolveu e envolveu a comunidade ou a escola ou a turma em ações concretas, é chegado o momento de dar um balanço, de avaliar os processos vivenciados, os conteúdos construídos e assimilados, os sujeitos que participaram do processo, e os resultados alcançados.  As formas e os instrumentos para fazer a avaliação são as mais variadas, como auto e hétero avaliação. Cada ator avalia o seu envolvimento e aprendizado e avalia os demais. O educando avalia a sua participação, a das famílias e da educadora, e a educadora, a mesma coisa e as famílias também. Não dá para pensar novo papel da escola, sem o seu envolvimento com as famílias e vice-versa. Nessa proposta, todos aprendem e ensinam, todos são co-responsáveis pelo crescimento uns dos outros.

3.3. Conteúdos

Se a escola e a educação passam a exercer novo papel na comunidade, elas também precisam de novos conhecimentos, novas ferramentas. Para tornar-se cidadão, os educadores e os educadores, precisam ter outros domínios além dos códigos formais da escrita, do cálculo, da leitura e da matemática. Precisam dominar novas habilidades e passar por novas vivências. A escola precisa criar novas ambiências além da docência. Levando em consideração a LDB, as Diretrizes Curriculares Nacionais, os Parâmetros Curriculares Nacionais, assim como as recomendações da Comissão Internacional de Educação da UNESCO (aprender a aprender, a ser, a fazer, a conviver e partilhar), podemos sugerir algumas temáticas, conscientes de que devem ser ajustadas de acordo com os níveis dos educandos, o local da escola, as condições subjetivas e objetivas de cada situação. Todas essas temáticas incluem os conhecimentos disciplinares.

  1. Os ecossistemas locais: as relações – homem, planta, solo, água, animais, clima, temperatura, microorganismos etc.
  2. Manejo sustentável das culturas e criatórios da região
  3. Matéria orgânica, técnicas de conservação, correção e adubação do solo.
  4. Controle natural de pragas e doença
  5. Agregação de valor, mercado e marketing
  6. Empreendedorismo e negócios (cultural, econômico financeiro e social)
  7. Formas de Organização do Trabalho (associativismo, cooperativismo, empresas…)
  8. Cultura: história, tradição, festas, lutas, conquistas, valores, identidade étnica, política social, ambiental.
  9. Direitos (códigos do consumidor, das águas, fauna e flora…)
  10. Constituição e Leis orgânicas de saúde, assistência social e educação.
  11. Terra, produção e produtividade.

 

  1. Práticas e experiências.

Toda essa proposta vem sendo vivenciada desde 1994, com um crescente contínuo e aperfeiçoamento. Inicialmente, foi pensada apenas como uma Proposta de Educação Rural – PER, para as escolas da primeira até a quarta série. O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, como viabilizou uma jornada a mais, foi uma oportunidade para a ampliação dos municípios que passaram a utilizar. Tanto em PE, como na Bahia, todos os relatórios avaliativos do PETI, colocam as duas experiências como um grande diferencial inovador na aplicação do PETI. Tem sido um exemplo de como programas sociais, compensatórios, paliativos, podem ser incorporados a dimensões mais estruturadoras, desde que haja decisão política e concepção pedagógica, que incluam mudança de modelos de desenvolvimento.  Não é uma proposta só para a sala de aula formal. Tem outros usos.

  • O formal.

Este trabalho é, via de regra, desenvolvido entre ONGs e Prefeituras Municipais e, no caso da Bahia, envolve a Universidade Estadual de Feira de Santana. As Ongs e Universidade centram-se na formação, planejamento das atividades dos professores, cabendo as Prefeituras a execução direta do trabalho, monitoramento e supervisão. É desenvolvido em escolas da rede municipal de ensino, sobretudo, da alfabetização à quarta série, nas seguintes regiões:

  1. Zona da Mata e Agreste em Pernambuco
  2. Região semi-árida (sisaleira), da Bahia, com incursões no recôncavo.
  3. Região do Garimpo Bom Futuro de Cassiterita, – Ariquemes – Rondônia.
  4. Regiões urbanas de pequenas cidades da zona da mata de PE.
  • O não formal.

São aplicadas em ‘Jornadas ampliadas’ no PETI, nas mesmas áreas acima colocadas. O sucesso acontece quando o município entende que, o ideal não são duas jornadas, onde uma é regular e outra não, onde uma é oficial, permanente, garantida pelo sistema municipal de ensino e outra é passageira, dependente da secretaria de Assistência Social. O ideal é uma proposta com jornada completa de oito horas, que distribuem suas atividades de acordo com uma só concepção, um só monitoramento e uma supervisão.

Na microrregião da Bacia do Goitá, o SERTA utiliza no curso de formação de Agentes de Desenvolvimento Local, um curso profissionalizante, que prepara jovens para serem protagonistas das mudanças pessoais e do seu entorno e circunstâncias. Os alunos estudam uma jornada nas escolas dos 4 municípios (Feira Nova, Glória do Goitá, Lagoa de Itaenga e Pombos), zona de transição entre a mata e o agreste. São jovens da oitava série em diante, de 15 a 19 anos. Iniciada a experiência em abril de 2000, já tem provocado muitos impactos positivos nas famílias, nos negócios, nas propriedades, nas escolas, nas igrejas e grupos de jovens, como no município. Trinta por cento são educandos de área urbana e setenta por cento de área rural. Pela manhã, estudam no espaço cedido pelo Ministério de Agricultura e Prefeitura Municipal de Glória do Goitá, a tarde ou noite nas escolas municipais ou estaduais. A experiência tem sido considerada por todas as pessoas que visitam como um referencial para a formação da juventude e do protagonismo juvenil, como para criação de Políticas Públicas para o adolescente.

É uma parceria com a Aliança com o Adolescente pelo Desenvolvimento do Nordeste, iniciativa de quatro instituidores: Instituto Ayrton Senna, Fundação Kellogg, Fundação Odebrecht e Área Social do BNDES. Hoje, a proposta amplia-se na formação de outros atores sociais, como produtores, conselheiros, lideranças de associações, artistas, artesãos, empresários, com as devidas adaptações e a referência aos mesmos princípios fundamentais e metodologia. Varia intensamente, em termos de técnicas, dinâmicas e conteúdos. A Proposta em Pernambuco passou a ser chamada de PEADS – Proposta Educacional de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável, por conta dos diversos usos (rural-urbano, ensino fundamental, profissionalizante, formação de lideranças). Antes era PER (Proposta de Educação Rural). Na Bahia é conhecida com o nome inicial das três etapas CAT (Conhecer, Analisar e Transformar)

Em Pernambuco no município de Vicência, a participação das famílias exprime-se não só no processo de aproximação mútua entre escola e pais, mas também no planejamento da gestão da escola. O planejamento da escola já é discutido com pais, professores e escola.

  1. Resultados

Há resultados que são comuns aos sujeitos envolvidos. A auto-estima pela identidade, pela cultura, a valorização de si mesmo, do seu ambiente, a crença na possibilidade de mudar alguma coisa na comunidade, a consciência coletiva, o enfrentamento dos problemas que atingem a comunidade e as pessoas, a solidariedade e o companheirismo, o novo olhar sobre as potencialidades, a formação de Conselhos Escolares com participação dos pais. Além dos resultados específicos.

  1. nos alunos

Melhora da aprendizagem, comunicação, vitória sobre a timidez de falar em público.

Trabalho em equipe.

Descoberta de que a educação não se dá apenas na sala de aula. A aprendizagem de matemática, português, ciência etc. a partir de vivências concretas da realidade.

Projeção de uma visão de futuro.

Desenvolvimento de potenciais artístico-culturais.

    1. nos educadores

Compromisso com a realidade rural, assumindo o papel de agente de desenvolvimento na área rural.

Adoção das próprias práticas debatidas em sala de aula.

Descoberta da prática de pensar a escola coletivamente e não apenas a sua sala de aula.

Busca de novas adesões.

Professores passam a aprender com os alunos e pais, inclusive aqueles “analfabetos”.

Maior curiosidade em perguntar, pesquisar mais e estudar.

Valorização dos conhecimentos prévios dos alunos.

Desenvolvimento de um novo olhar sobre a escola e a realidade, gerando um interessar-se pela vida econômica das familias, pelo aproveitamento dos terrenos e pelo equilíbrio do meio ambiente.

Crescimento da dimensão cidadã do professor, ao sentir-se responsável pela transformação da realidade, assumindo a dimensão de que para esta transformação há a perspectiva estrutural, mas há também a responsabilidade pessoal.

  1. na comunidade/na família

Aumento do criatório, da produção agrícola, utilização de novas técnicas de manejo do plantio e criatórios, difusão de galinhas caipiras de raças e linhagens melhoradas, organização de associação e preservação do meio ambiente, tratamento do lixo. Resgate, pela família, da importância da escola e do estudo e valorização do espaço rural (seu trabalho, sua vida). Valorização do conhecimento dos mais velhos; produção de conhecimento em relação à comunidade (o que cria, o que faz, como faz, com quem faz, o que produz, serviços existentes). Maior aproximação entre pais e filhos (geração).

 

  1. no município

Na zona da Mata, incentivadas pela escola, as crianças realizaram um censo agropecuário, um censo populacional e um ambiental, o que tem levado a iniciativas de reflorestamento, de tratamento do lixo, de incentivo à criação de animais, proteção das matas, despoluição de rios. A Proposta serviu aos gestores como um referencial para pensar o Desenvolvimento Sustentável.

  1. Educação e interfaces.

Os processos acima debatidos e refletidos nos mostram as várias interfaces que existem, devem e podem existir no âmbito da educação:

  • Educação e meio ambiente
  • Educação e saúde
  • Educação, produção, renda e trabalho
  • Educação, arte e cultura
  • Educação, biociência e bio-ética.
  • Educação, democracia e gestão da comunidade.
  • Educação, Justiça, Direito e Cidadania.

 

 

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